Alexandre Saraiva
Campana ilegal da Polícia Federal pode por fim à Operação Sermão aos Peixes
Política

Polícia Federal teria armado vigília em frente a residência do ex-secretário de Saúde do Maranhão

A Polícia Federal pode ter detonado com a Operação Sermão aos Peixes, nessa quarta-feira 19, ao ter armado campana em frente a residência do ex-secretário de Saúde do Maranhão, Ricardo Murad. Como o ex-secretário, que já havia prestado depoimento de quase 15 horas na sede da PF um dia antes, não foi informado oficialmente da necessidade de vigília deste tipo, a campana feita por agentes armados de fuzis em uma Toyota Hilux SRV preta, de placas OXZ-4936, pode ser caracterizada como ilegal, e dar margem para a anulação de todas as provas obtidas até agora pela Polícia Federal.

Durante a Operação Sermão aos Peixes, a PF identificou um suposto esquema de burla às regras da lei de licitação, que teria, segundo as investigações, facilitado o desvio de verba pública federal, com fim específico de enriquecimento ilícito de Murad e outros envolvidos. Apesar da terceirização na gestão da rede de saúde pública estadual ter sido iniciada no governo Zé Reinaldo, continuado no governo Jackson Lago e ainda imperar no governo Flávio Dino, inclusive com a mesma Organização de Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) Instituto Cidadania e Natureza (ICN), apenas a gestão de Ricardo Murad, que é cunhado da ex-governadora Roseana Sarney (PMDB), foi investigada e apontada como suspeita de corrupção. Questionado sobre esse direcionamento, o superintendente Regional no Maranhão, delegado Alexandre Saraiva, alega que "não há nada de estranho nisso".

Vale lembrar que, para que as provas obtidas pela PF possam ser anuladas devido à campana ilegal na casa do ex-secretário de Saúde do Maranhão, um habeas corpus precisa ser impetrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Caso o STJ decida pela anulação, esta não será uma decisão inédita, uma vez que já foram anuladas provas obtidas pela Polícia Federal em outras ações, como a Operação Faktor (ex-Boi Barrica), que investigou negócios do empresário Fernando Sarney no Maranhão e de outros familiares do ex-senador José Sarney (PMDB-AP); a Operação Satiagraha, que investigou o banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity; e a Operação Castelo de Areia, que apurou supostas irregularidades relacionadas à atuação da Construtora Camargo Corrêa.

O Atual7 procurou a defesa de Ricardo Murad, para saber se pretende acionar o STJ pedindo a anulação das provas obtidas pela PF durante a Operação Sermão aos Peixes, mas até a publicação desta matéria não houve retorno.

 

Terceirização na Saúde teve início com Zé Reinaldo; ICN garfou mais de R$ 1 bilhão
Política

Valor se refere apenas aos dois últimos anos de comando do ex-governador. O médico Benedito Silva, dono do ICN, faturou também com a Centervida

A Polícia Federal precisa explicar com urgência, em especial o delegado Sandro Jansen, chefe da Unidade Especial de Repressão e Controle de Desvio de Verbas no Maranhão e responsável pela condução das investigações da Operação Sermão aos Peixes, deflagrada preliminarmente na tarde de segunda-feira 16 e oficialmente durante toda essa terça-feira 17, por que divulgou em nota que o modelo de terceirização da gestão da rede de saúde pública estadual foi implementado no Estado pelo ex-secretário de Saúde Ricardo Murad, conduzido sob coerção para prestar depoimento nos autos na sede da PF.

A razão da necessidade para as explicações é simples: a informação não condiz e está distante da verdade, o que aponta para o desconhecimento ou - pior - direcionamento político da Polícia Federal na operação que moveu mais de 200 policiais federais e 10 servidores da CGU (Controladora Geral da União).

Documento extraído do Diário Oficial do Maranhão mostra que ICN é contratada para gerir a saúde no pública estadual, com dispensa de licitação, antes de Murad assumir a SES
Diário Oficial MA PF relevou Documento extraído do Diário Oficial do Maranhão mostra que ICN é contratada para gerir a saúde no pública estadual, com dispensa de licitação, antes de Murad assumir a SES

Diferente do divulgado oficialmente pela PF, o modelo de terceirização na gerência do sistema de saúde pública do Maranhão não foi iniciado em 2010 por Murad, mas desde o ano de 2003, mesmo ano em que o Instituto Cidadania e Natureza (ICN), uma das Oscips apontadas na investigação como integrantes de organização criminosa, foi criado e apresentado aos cofres do Estado pelo chefe da Casa Civil do governo Flávio Dino, o ex-deputado estadual Marcelo Tavares (PSB).

Tavares foi quem apresentou ao tio e então governador do Estado, José Reinaldo Tavares (PSB), o modelo de modelo de gestão capaz de empregar pessoas sem concurso público e contratar empresas sem licitação, mesma forma a qual a Polícia Federal acusa Murad de ter utilizado para burlar as regras da lei de licitação e facilitar o desvio de verba pública federal. O Atual7 tentou contato com os Tavares, mas ambos não retornaram as mensagens enviadas até a publicação desta matéria. A PF, por meio de seu superintendente Regional no Maranhão, delegado Alexandre Saraiva, já havia se manifestado durante coletiva de imprensa sobre a operação. Segundo Saraiva, que foi evasivo e cortou o assunto para outras perguntas dos jornalistas, "não há nada de estranho nisso".

Zé Reinaldo e Jackson Lago

A secretária de Saúde de São Luís e então responsável pelos contratos milionários com o ICN, Helena Duailibe
Reprodução Movimentadora dos cofres A secretária de Saúde de São Luís e então responsável pelos contratos milionários com o ICN, Helena Duailibe

Em setembro do ano passado, reportagem já revelava que contratos feitos por Zé Reinaldo durante os dois últimos anos em que esteve no comando do Palácio dos Leões, 2005 e 2006, renderam mais de 1 bilhão de reais dos cofres públicos ao ICN. Todos os contratos foram assinados, na época, pela então secretária de Saúde do Maranhão e atual secretária de Saúde de São Luís, a peemedebista Helena Duailibe, entre eles o para administrar e gerenciar o Complexo Ambulatorial e Hospitalar do Hospital Dr. Carlos Macieira, por 143 milhões de reais, além da Maternidade Marly Sarney.

Tamanho o derrame de dinheiro público com dispensa de licitação e suspeita de direcionamento feito por Helena Duailibe na conta do Instituto Cidadania e Natureza, o então deputado estadual Afonso Manoel (PMDB) - seu esposo, foi forçado a ir à tribuna da Assembleia, por diversas vezes, negar que fosse ele o verdadeiro proprietário do instituto.

Além de Zé Reinaldo, o ex-governador Jackson Lago (PDT), cassado em 2009 por corrupção praticada coincidentemente em convênios assinados por Helena Duailibe, durante o tempo em que permaneceu no controle do Executivo estadual, também se utilizou do modelo de terceirização da gestão da rede de saúde pública estadual continuada por Ricardo Murad e atualmente pelo governador Flávio Dino, ao manter e ainda aditar os contratos com o instituto, que embolsou de seu governo mais de 8 milhões de reais.

Perna curta

Apesar dessas informações serem todas facilmente obtidas em dados apertos do Estado e da Assembleia Legislativa, a Polícia Federal decidiu divulgar que Ricardo Murad quem passou a gestão da rede de saúde pública estadual para entes privados, informação fora da verdade e que levanta graves suspeitas para o uso político da PF e possivelmente até do Ministério Público Federal, que também participou da Operação Sermão aos Peixes. É que o MPF, vale lembrar, tem como subprocurador-geral ninguém menos que Nicolao Dino, irmão do governador Flávio Dino.

A suspeita tornar-se ainda mais grave devido ao fato de que o médico ginecologista Benedito Silva Carvalho, um dos cabeças do ICN e também dono da cooperativa Centervida (Centro Integrado de Atendimento à Saúde) - que recebia ainda no mesmo esquema cerca de 6 milhões de reais por mês para administrar e gerenciar o PAM da Cidade Operária, o Hospital da Vila Luizão, o Hospital Geral Tarquínio Lopes Filho (Hospital do Câncer no Maranhão), o Hospital Getúlio Vargas, a Colônia Nina Rodrigues, o Hospital Aquiles Lisboa, o Infantil Juvêncio Matos, o Ipem de Colinas e o Alarico Pacheco, de Timom -, teria sido o único que teve a prisão preventiva decretada pela Justiça mas não foi encontrado pela Polícia Federal e nem dado como foragido. Nos bastidores, corre desde 2005 a informação de que ele seja tio de Marcelo Tavares.

Operação deflagrada pela PF deve alcançar secretário de Saúde de Flávio Dino
Política

OS e Oscips apontadas como membros de organização criminosa operam no governo comunista, inclusive empregando amiga e cunhadas de secretário

A Polícia Federal acabou revelando, em release divulgada no site institucional sobre a Operação Sermão aos Peixes, deflagrada no Maranhão na manhã desta terça-feira 17, que as investigações contra o desvio de recursos públicos federais do Fundo Nacional de Saúde destinados ao Sistema de Saúde do estado devem alcançar o titular da SES no governo Flávio Dino, o médico Marcos Pacheco. Não há informações ainda, contudo, se as investigações culminarão em mandado de prisão preventiva, de busca e apreensão ou de condução coercitiva contra Pacheco.

Delegados da PF explicam durante coletiva que OS e Oscis que ainda operam na Saúde do Maranhão faziam parte de organização criminosa
Stenio Johnny Orcrim Delegados da PF explicam durante coletiva que OS e Oscis que ainda operam na Saúde do Maranhão faziam parte de organização criminosa

Explica-se: de acordo com informações divulgadas pela própria PF, o modelo de terceirização da gestão da rede de saúde pública estadual por meio de entes privados - Organização Social (OS) e Organização de Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) - facilitou o desvio de verba pública federal. Com esse modelo de gestão, ainda segundo a PF, foi possível empregar pessoas sem concurso público e contratar empresas sem licitação.

Ocorre que o governo mudou, Flávio Dino (PCdoB) assumiu o comando do Palácio dos Leões, mas o modelo de gestão da rede de saúde pública estadual não mudou e continua sendo gerido por entes privados. E mais: pelas mesmas OS e Oscips que controlavam a saúde pública estadual no governo anterior, além de mais outras novas que também ganharam uma parte recheada do bolo, inclusive com contratações com dispensa de licitação e distribuição de empregos sem a necessidade de concurso público.

A declaração dada pelo titular da Superintendência Regional da Polícia Federal no Maranhão, delegado Alexandre Saraiva, durante coletiva de imprensa sobre a operação, mostra bem isso. Segundo Saraiva, "a saúde estava sendo controlada por uma organização criminosa. Era esse tipo de gente que estava cuidando da saúde do Maranhão".

Esse "tipo de gente" apontada pelo superintendente da PF, no caso, cai exatamente sobre a mesma Orcrim que opera e controla a Saúde no governo Flávio Dino, inclusive empregando comprovadamente familiares de auxiliares do comunista sem concurso público, a exemplo das cunhadas e até da amiga enfermeira do secretário de Assuntos Políticos e Federativos, Márcio Jerry Saraiva Barroso, que teve o salário super aumentado para mais de 10 mil reais.