Juiz usa Princípio da Adequação Social e absolve acusado de violação de direito autoral
Maranhão

Juiz usa Princípio da Adequação Social e absolve acusado de violação de direito autoral

Clésio Cunha fundamentou a decisão com base no instrumento que permite reconhecer que não se pode castigar aquilo que a sociedade considera correto

O juiz Clésio Coelho Cunha, responsável pela 3ª Vara Criminal, absolveu um acusado de crime de violação de direito autoral com base no “Princípio da Adequação Social”, instrumento que permite reconhecer que condutas mesmo descritas na lei penal, quando socialmente aceitas — seja pelos costumes, folclore ou cultura —, não são consideradas como crime.

Na polêmica sentença, o magistrado afirma que, durante a análise do caso, trafegou pelas estradas do Maranhão, onde constatou que há muitos vendedores “com uma profusão de autores e intérpretes à venda”. Contudo, relata, em nenhum desses lugares há inconformismos dos que passam por lá. Nem mesmo de autoridades, afirma.

Segundo ele, isso ocorre “em razão da consciência de não é justo atacar com o Direito Penal Incriminador táticas e estratégias de sobrevivência daquelas pessoas menos favorecidas”.

“Condenar o acusado neste processo seria praticar seletividade penal e hipocrisia penal com o aprisionamento desnecessário do acusado; e combater táticas de sobrevivência de pessoas para as quais as oportunidades lhes deram poucas escolhas”, despachou— baixe a decisão.

Falta de materialidade

A decisão foi fundamentada, também, no artigo 386, II e III do Código de Processo Penal, considerando, segundo o magistrado, não ter ficado satisfatoriamente provada a materialidade do crime nos autos; e diante da ineficiência do auto de apreensão feito pela polícia.

Na sentença, o magistrado determinou a devolução da motocicleta e todos os bens aprendidos do acusado pela polícia, incluindo CDs e DVDs virgens.

Francisco do Carmo foi denunciado pelo MP-MA haver sido preso em flagrante por uma equipe da Polícia Civil. Após campanas, os agentes teriam avistado o acusado pilotando uma motocicleta e trazendo na garupa o que identificaram nos autos apenas como uma “caixa suspeita”. Ainda conforme o auto de apreensão, os CDs e DVDs foram identificados como “aparentemente” falsificados. Francisco

Após a prisão em flagrante, o acusado foi posto em liberdade mediante fiança, tendo confessado no interrogatório que costuma gravar, em sua casa, CDs e DVDs, para serem vendidos em uma banca própria instalada na Feira do João Paulo, em São Luís.

Durante a audiência de instrução e julgamento, a inquirição das testemunhas já ouvidas no inquérito policial e o interrogatório do acusado, o juiz Clésio Cunha concluiu que, em casos como este, quando for feita a lavratura do auto de apreensão, devem ser observadas as regras previstas no Código de Processo Penal: a autoridade policial procederá à apreensão dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos, em sua totalidade, juntamente com os equipamentos, suportes e materiais que possibilitaram a sua existência, desde que estes se destinem à prática do ilícito.

Também deverá ser lavrado termo com a descrição de todos os bens apreendidos e informações sobre suas origens, o qual deverá integrar o inquérito policial ou o processo. E, após a apreensão, será realizada, por perito oficial, ou por pessoa tecnicamente habilitada, perícia sobre todos os bens apreendidos e elaborado o laudo que deverá integrar o inquérito policial ou o processo.

Segundo o magistrado, no caso referente ao acusado Francisco do Carmo, a autoridade se descuidou de observar essas prescrições processuais e ainda não fez um auto de apreensão correto, pois após apreender os CDs e DVDs, afirmou que estes eram “aparentemente falsificados” ou “aparentando serem falsificados” e que as demais mídias, num total de 500, eram virgens, ou seja, sem gravações nas mídias. E não afirmou de forma conclusiva do que se tratava. Também não foi realizada, após a apreensão dos equipamentos e dos CDs e DVDs, a perícia prevista que deveria fazer parte dos autos.

“A descrição formalmente criminosa é de quem reproduz total ou parcial obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente; e, nestes autos, não há a descrição dessa conduta, nem muito menos quais autores e intérpretes foram copiados”, complementou.



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